Sumário1.
Aspectos das nulidades contratuais na modernidade sob o prisma da
instrumentalidade processual e o rigorismo jurídico: 2. A vontade das
partes nos negócios jurídicos: 3. A norma legal e os reflexos advindos
de seu rigorismo: 4. Referências Bibliográficas
1. Aspectos das Nulidades Contratuais na Modernidade Sob
o Prisma da Instrumentalidade Processual e o Rigorismo Jurídico
O
ato negocial quando viciado por uma nulidade absoluta é tido como
ineficaz, pois não produz efeitos e consequentemente é inexistente, tal
fato é importante ser salientado justamente porque com o progresso
evidenciado no campo do direito, a tendência de se entenderem as
nulidades do processo à luz dos princípios gerais de direito.
Mesmo
porque, examinar as nulidades processuais contidas no ordenamento
jurídico, significaria tratar de cada um dos dispositivos do código
civil separadamente, já que, apenas os artigos 243 a 250 do referido
diploma em vigor, especificam à matéria, e estão longe de oferecerem uma
disciplina completa.
O
tema envolve várias dificuldades, que vão da simples interpretação da
palavra "validade" no que se refere ao ato negocial, até o prejuízo que
advém de um ato anulado, justamente porque a conotação "convalidar"
demonstra ser um precedente para a inexistência do ato.
Com
relação especificamente ao processo, há regras específicas que podem ser
elencadas sobre as nulidades processuais, como por exemplo: as nulidades
absolutas podem ser alegadas pelas partes e a qualquer tempo, sendo que,
podem ser decretadas de ofício pelo magistrado, não se cogitando da
preclusão, ao contrário da anulabilidade que é alcançada quando
intempestiva pela preclusão e ainda, não pode ser decretada de
ofício.
Não
obstante tais regras estejam sendo aplicadas, são demasiadamente
genéricas. A par do tema, comentam TEREZA ALVIM e ARRUDA
ALVIM(1) que " há, então, normalmente comprometimento de todo
um segmento processual, posterior ao próprio ato anulado ou decretado
nulo, segmento este que consiste nos atos que do ato anulado
dependam."
Ressalte-se
que, no que tange à categoria das invalidades dos atos jurídicos,
insertas no âmbito das relações privadas, tanto a anulabilidade quanto a
nulidade de um ato negocial, funda-se em características específicas,
que por incrível que pareça, não encontra-se disciplinada em nosso
ordenamento, conforme exposto brevemente linhas acima.
A
bem da verdade, independente de um ato negocial se encontrar viciado por
esse ou aquele vício formal, a idéia de insanibilidade atrelada a
nulidade absoluta é demasiadamente controvertida, já que a norma
material choca-se com a processual.
O
que ocorre, é que, ao passo que o direito processual civil faculta
sanar-se um vício, o direito civil, norma material, veda que o
magistrado supra nulidades, mais um fator que ampara a ampliação do
livre agir do magistrado.
Em
que pesem assim as abalizadas opiniões contrárias mas, submeter às
mesmas normas gerais aos ramos do direito público e privado, seria
apostar em uma técnica baseada em valores absolutos, pois é impossível
confundir nulidades processuais com nulidades civis, pois há vários
critérios que as classificam.
2. A Vontade das Partes nos Negócios Jurídicos
No
âmbito das nulidades processuais objetos desse estudo, é importante que
se tome conhecimento que a perspectiva formalista do processo devem ser
evitada, a fim de que se preserve o interesse das partes.
Um
ponto importante é que mesmo com o constante crescimento e massificação
das relações contratuais, a autonomia da vontade continua prevalecendo
por ocasião da pactuação dos negócios jurídicos, e não obstante seja um
elemento volitivo, convalida o ato negocial.
A
primeira vista nos parece exageradamente vantajoso que no mundo de hoje
as partes estejam se valendo tanto de um instrumento contratual para
expressarem suas pretensões, porém, surgem alguns pontos que podem ser
questionados: o primeiro é um tanto óbvio é que, na medida em que
aumentam os pactos negociais, cresce a probabilidade de erros, de vícios
em ato de vontade..
CAIO
MÁRIO DA SILVA(2), citado por FILHO (1995, p.34) afirma que o
fundamento e os efeitos do negócio jurídico assentam então na vontade,
não uma vontade qualquer, mas aquela que atua em conformidade com os
preceitos ditados pela ordem legal. E tão relevante é o papel da vontade
na etiologia do negócio jurídico, que se procura identificar a sua
própria idéia conceitual com a declaração de vontade, constituindo-se
desta forma a sua decisão.
A
segunda questão está atrelada a primeira, e cinge-se em que, na medida
em que se instaura um contrato entre as partes e se identifica um vício
ou defeito no mesmo, independente de estar esse sendo apreciado pelo
judiciário, deve ser a falha identificada e sanada quando possível, e,
em se tratando de nulidade deve ser a mesma decretada de ofício.
Infere-se
assim, que tudo quanto se relaciona ao instituto dos contratos, sejam
esses expressos ou verbais, e seja qual for a sua denominação, prevalece
a autonomia da vontade como fator relevante entre os contratantes.
Enfim,
deve ser ressaltado que, muitas das vezes admitir-se a repetição de um
ato, não é assegurar um provimento justo, já que essa imposição da lei
além de ignorar a vontade das partes, inclui, como sempre, o rigorismo
exagerado da norma positivada.
3. A Norma Legal e os Reflexos Advindos de Seu
Rigorismo
Mesmo
com seu caráter positivista, e sua característica cogente, a norma legal
é imprecisa, e portanto incoerente com a realidade vivida
atualmente.
No
âmbito das relações negociais por exemplo, constam em certos
dispositivos legais qual o procedimento a ser adotado para que uma
relação jurídica nasça, prescrevendo a forma específica para que seja
eficaz. Tais regras frisam ainda que, não sendo observado o estatuído, o
ato é declarado inexistente.
Entretanto,
de outro lado, a própria disposição da norma determina que o magistrado
pode regularizar o incidente, podendo tornar válido e perfeito o
ato.
Ora,
não parece crível quanto mais lógico, que a aplicação da lei em seu
caráter cogente seja tão antagônica com relação ao que dispõe,
dissonante pois com a realidade, que ao passo que conceitua um ato como
inexistente e causa reflexos nos atos ulteriores, concede ao magistrado
poderes para repetir e sanar o problema somente quando não for tão grave
assim o vício observado, fazendo parecer que o juiz mesmo exercendo a
jurisdição não pode impedir se faça uma injustiça ou se cause um
prejuízo.
A
importância desse tema está em que, muitas vezes a parte celebra um
contrato que além de oportuno, vai lhe trazer benefícios, sendo que se
ocorrer um ato que invalide o se negócio ou vicie o ato jurídico
praticado, não interessa à mesma que o negócio seja anulado, tornando-o
inexistente.
Depreende-se
assim, no que tange à nulidade absoluta e seus efeitos, que quando da
apreciação de um contrato pelo poder judiciário, deveria o órgão
julgador levar em consideração além do interesse das partes, a utilidade
da prestação inserta no contrato.
As
conclusões de Cármem Lúcia Antunes Rocha(3), prescrevem dessa
forma:
"Não basta, contudo, que se assegure o acesso
aos órgãos prestadores da jurisdição para que se tenha por certo que
haverá estabelecimento da situação da justiça na hipótese concretamente
posta a exame. Para tanto, é necessário que a jurisdição seja prestada -
como os demais serviços públicos - com a presteza que a situação impõe.
Afinal, às vezes, a justiça que tarda, falha. E falha exatamente porque
tarda. Não se quer a justiça do amanhã. Quer-se a justiça hoje. Logo, a
presteza da resposta jurisdicional pleiteada contém-se no próprio
conceito do direito-garantia que a jurisdição representa. A liberdade
não pode esperar, porque, enquanto a jurisdição não é prestada, ela pode
estar sendo afrontada de maneira irreversível; a vida não pode esperar,
porque a agressão ao direito à vida pode fazê-la perder-se; a igualdade
não pode aguardar, porque a ofensa a este princípio pode garantir a
discriminação e o preconceito; a segurança não espera, pois a tardia
garantia que lhe seja prestada pelo Estado terá concretizado o risco por
vezes com a só ameaça que torna incertos todos os direitos."
A
bem da verdade, o Judiciário está fadado de feitos procrastinatórios,
acionar o poder judicial nos dias de hoje, tem sido uma espécie de
investimento a longo prazo, onde se deposita uma pretensão nas mãos de
um órgão de investidura para um retorno eventual, condicionado a uma
apreciação jurídica que pode não acontecer.
Não
bastasse isso, há o excesso no rigorismo processual, pois o processo
mesmo sendo norteado pelos princípios gerais de direito, foge à sua
função social, que é dar à parte litigante uma solução justa para o seu
conflito. Isso porque, geralmente quando se aciona o poder judiciário o
que se deseja é que o magistrado analise o seu caso e lhe dê uma
resposta.
Isso
é enfatizado a fim de que se perceba que o excesso no formalismo
jurídico na maior parte das vezes atrapalha o julgamento de certos
pedidos, justamente porque é fato notório que há muitos casos para serem
apreciados e decididos.
Assim,
supondo-se que uma pessoa celebre um contrato bilateral, e que, no
momento de sua existência no mundo jurídico, um vício do consentimento
(o erro por exemplo), sobrevenha sobre o ato tornando-o inexistente, e
consequentemente, ineficaz, muito bem, mesmo que esse vício tenha sido
invocado por uma das partes contratantes, podem os mesmos desejarem
preservar o que até ali fora pactuado e pedirem a convalidação daquele
ato especificamente, evitando até mesmo dispêndios com a formação de um
novo instrumento.
Partindo
então do princípio de que, o negócio tenha sido pactuado e esteja sendo
útil à parte, a declaração de inexistência do contrato celebrado,
refletirá um prejuízo para as partes, que por certo não querem ver
extintas todas as suas pretensões.
Por
essas e outras razões é que o princípio da instrumentalidade das formas
e o princípio da inafastabilidade do poder judiciário deve ser aplicado,
vez que além da ação e defesa, há que se levar em conta a vontade das
partes.
Nesse
particular, surgem várias questões acerca do processo como instituto
jurídico, já que existe um ideal de propiciar ao demandante e demandado
o tão almejado acesso à ordem jurídica justa pelo processo, surgindo
então a dúvida sobre como deveria ser conduzido o processo para que os
mesmos obtivessem o resultado favorável, sem desencadear-se
exaustivamente todos os meios de resistência à apreciação de sua
pretensão.
Vê-se
assim, outro princípio importante, o contraditório, que é um instrumento
estatal para exercício do poder, já que, não sendo possível para a parte
exercer todos os direitos substanciais que vem a ter, deve ter efetivada
a participação do magistrado.
Seguindo
a lição do jurista WATANABE(4) podemos afirmar que:
"não basta viabilizar o acesso ao processo:
precisa oferecer um processo sensível às aspirações dos sujeitos
litigantes, que por sua vez viabilize o acesso à ordem jurídica justa,
de que se vem falando. Só com isso é que, através da observância da
cláusula due process of law, se dá conteúdo substancial à garantia
constitucional da inafastabilidade do controle jurisdicional.
"
Enfim
pode-se dizer que, as inúmeras lacunas existentes em nosso direito e
ainda a sua imprecisão no campo das nulidades, geram incertezas no mundo
jurídico, vez que ao passo que prima pela autonomia e consentimento das
parte e garante a equidade do magistrado na apreciação dos casos, tolhe
o seu convencimento e instala confusões na esfera das nulidades
contratuais, ou seja, impõe uma regra legal em certos casos e depois faz
ressalvas sobre uma possível repetibilidade do ato.
Tendo
em vista assim a complexidade gerada com a evolução dos meios de
produção e o aumento dos contratos, somados às novas concepções
jurídicas contratuais, nada mais justo e coerente do que no mínimo, se
preservar o interesse das partes, se essas assim desejarem, promovendo
se não uma completa, mas uma aparente isonomia entre as partes.
Já
que uma reestruturação radical em nosso meio forense não será possível,
pelo menos a curto prazo, (note-se que o nosso Código Civil é de 1916),
uma das soluções seria dar mais autonomia ao magistrado, dentro é claro,
de alguns limites constitucionais e preservando as partes das
vicissitudes alheias, a fim de que pudesse tentar cumprir o fim social
da lei.
Ora,
a tendência na modernidade, principalmente no instituto dos contratos é
cumpri-lo de forma que seja bom para ambas as partes contratantes,
aplicando sua característica de bilateralidade, fazendo valer os
princípios gerais do direito quando houver lacunas na norma, analisando
do ponto de vista também econômico, até onde é valido desconstituir o
negócio praticado, garantindo autonomia ao magistrado para que possa
fazer sua valoração da forma mais justa e coerente possível.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
DINAMARCO,
Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo.2ª ed., São
Paulo, RT, 1990.
DINIZ,
M. H. Curso de direito civil brasileiro. Teoria geral do direito
civil, 5ª ed., São Paulo: Saraiva, 1988, p. 270.
FILHO.
J. A. O negócio jurídico e sua teoria geral. 3ªed. São Paulo:
Saraiva, 1995.
WATANABE,
K. Controle jurisdicional e mandado de segurança contra atos
judiciais. São Paulo: RT, 1980.
Notas
1.ALVIM,
A.; PINTO, T. A. A. Nulidades processuais. São Paulo: RT,
1992.
2.SILVA,
C.M. Instituições do Direito Civil. 5ª ed. Forense, v. 1, p. 413,
1980.
3.ROCHA,
C. L. As garantias do cidadão na justiça. São Paulo: Saraiva,
1993, p. 37
4..
Controle jurisdicional e mandado de segurança contra atos
judiciais. op. cit.