"...soy
de aquellos que piensan que el derecho es mutcho menos la obra del
legisladoe que es producto constante y espontâneo de los hechos. Las
leues positivas, los Códigos, pueden permanecer intactos en sus textos
rigidos: poco importa; por la furza de las cosas, bajo la presión de los
hechos, de las necessidades prácticas, se forman constantemente
instituciones juridicas nuevas." Léon Duguit (1)
Introdução
O
uso corrente consagrou uma espécie de ajuste informal que atende aos
interesses das partes que não podem, ou não querem, vincula-se a um
contrato definitivo. Consiste numa promessa, unilateral ou bilateral, de
conclusão futura dos negócios jurídicos que reclamam determinado
contrato-tipo.
Assim,
quem se vê impedido de celebrar uma avença típica, ou quando esta
revela-se inoportuna, dando certas condições desfavoráveis ao
estipulante, como, por exemplo, a compra e venda que admite o pagamento
em múltiplas e sucessivas prestações, modalidade que não aconselha aos
interesses do proprietário a transferencia do domínio do bem alienado,
vale-se, então, de uma promessa, que é, de fato, uma declaração afeta a
uma obrigação de fazer, em que se estatui, exatamente, a obrigatoriedade
da satisfação da exigência formal requerida pela lei para perfeição do
negócio jurídico.
Relacionando-se
com a conclusão futura da exigência formal, poder-se até mesmo
considerar que este seria um modus convencional informal,
já que, em sendo a obligatio faciendi consistente na prestação de
reproduzir o conteúdo do acordo, dando-lhe forma jurídica definitiva, é
acordo atípico, não reclamando forma especifica, nem disciplina
peculiar, senão aquela alusiva ao gênero subscrita pela doutrina e pela
jurisprudência.
A
despeito de referencias nas Ordenações Filipinas (Livro IV, Título
XIX) e Afonsinas (Livro IV, Título 57, parágrafo primeiro) a
popularização de tal avença, aplicada à compra e venda de bens, entre
nós, registrou maior incremento no século vinte, mais precisamente na
década de trinta, quando o mercado imobiliário, pela primeira vez na
historia do país, experimentou um crescimento inesperado.
No
contexto referido, cogita-se que industriosos operadores jurídicos
teriam revisitado o pacto de contrahendo dos romanos e nele
encontraram a fonte doutrinária provisionadora de um novo negócio
jurídico, adequado aos interesses ditados pela conjuntura econômica. Se
este, verdadeiramente, foi o arquétipo do inovador molde contratual, os
responsáveis por sua configuração não teriam como ignorar que os romanos
negavam ao pactum o direito à ação, além de ser o instituto
reputado como subserviente ao contractus, eis que o pacto assim
conformado, objetivava, exatamente, a constituição de acordo voltado
para a obrigação de contratar, sendo, de fato, mera promessa de
contratar. Configurando-se como de caráter pessoal a relação
jurídica, por via de conseqüência, evidenciava-se a impossibilidade de
garantir a efetividade da promessa, já que a obrigação de fazer não
admitia execução compulsória, competindo ao prejudicado pelo
inadimplemento, valer-se apenas da obrigação de indenizar.
A
promessa, por conseguinte, intencional ou casualmente, caracterizava-se
instrumento adequado às oscilações do mercado imobiliário, tendente a
favorecer os interesses da parte dedicada à especulação financeira,
exatamente em razão da sua precariedade como instrumento de tutela
jurídica.
Ao
gênero que servia à espécie – o contrato preliminar – era atribuído o
crédito de promessa veraz, apta a gerar a expectativa jurídica de
transmissão do domínio, mas era instrumento flexível, complacente quanto
à possibilidade de desfazimento da obligatio, em proveito da
realização de novo negocio.
A
maleabilidade depreendida da construção inaugural, pode ter contribuído
para a equivocada compreensão dessa via contratual, dando-a como
instituição jurídica precária quanto à garantia de adimplemento da
obrigação, de eficácia questionável e com estabilidade inevitavelmente
provisória.
Na
prática da venda de imóveis, principalmente de lotes de terrenos
urbanos, cujo preço era desdobrado em múltiplas parcelas de pagamento,
concluíam as partes um acordo de vontades, em que o vendedor prometia
transferir o domínio do imóvel alienado, por escritura pública, tão logo
o comprador satisfizesse a ultima prestação de pagamento. Em
contrapartida, o adquirente comprometia-se a fazer valiosa a sua
promessa de realizar o pagamento conforme as condições e os prazos
pré-ajustados.
Ocorreu,
compreensivelmente, que, à medida em que o mercado imobiliário
desenvolvia suas atividades animado por uma celeridade inimaginável,
nessa mesma proporção, verificava-se a avidez da especulação dos que
operavam com imóveis. Em conseqüência, o preço atribuído ao imóveis
acusava valorização em escala geométrica, constatando-se esse fenômeno
até mesmo, incontinenti à conclusão do contrato, em razão do crescimento
despropositado da demanda, fato que estimulou os vendedores a buscarem o
lucro fácil através da venda a terceiros dos bens já alienados. Cientes
de que o ajuste tinha uma natureza precária, os operadores foram levados
a descumprir os seus compromissos, revendendo a quem ofertasse melhor
preço, os imóveis já alienados, objeto das promessas de venda.
De
fato, os especuladores sentiram-se encorajados em face do disposto no
artigo 1.088 (2) do Código Civil, que faculta o direito de
arrependimento às partes que não se louvaram em instrumento público,
quando este for exigido como prova do ajuste, devendo, em tal
circunstância, ressarcir perdas e danos ao prejudicado. Ora, o proveito
econômico obtido pelo alienante, na revenda do imóvel, era muitas vezes
maior que o valor devido na restituição, mesmo acrescida das perdas e
danos reclamada pelo contraente lesado, fato que contribuiu para
alicerçar como regra a faculdade resolutiva das promessas,
excepcionalizando-se, como se fora liberalidade ou apego ao empenho da
palavra dada, a mantença do compromisso.
Atento
à desigualdade dessa relação jurídica, o governo Getúlio Vargas, sob
inspiração do Ministro da Justiça Francisco Campos, editou o decreto-lei
58, em 10 de dezembro de 1937, dispondo sobre o loteamento e a venda
de terrenos para pagamento em prestações, que estabelecia a
disciplina dos loteamentos e a tutela dos direitos à aquisição coletados
pelo compromissário comprador de terrenos loteados e não-loteados,
conforme prescrevem os artigos 4, 5 e 22, do decreto referido, este
ultimo transcrito literalmente:
Art. 22 – Os contratos, sem cláusula de
arrependimento, de compromisso de compra e venda e cessão de direito de
imóveis não loteados, cujo preço tenha sido pago no ato de sua
constituição ou deva sê-lo em uma ou mais prestações desde que inscritos
a qualquer tempo, atribuem aos compromissários direito real oponível a
terceiros, e lhes conferem o direito de adjudicação compulsória nos
termos dos artigos 16 desta lei, 640 e 641 do Código de Processo
Civil.
Pode-se
sinalizar, a partir da edição do decreto referido, uma nova orientação
jurídica aos ajustes, até então concebidos como meros intermediários
ou precursores dos definitivos, retirando-se-lhes o caráter
de precariedade e até mesmo de provisoriedade, vale dizer, de
fragilidade, enquanto expressão das obrigações decorrentes do acordo de
vontade das partes.
A equivalência entre a percepção popular e a
razão jurídica
quanto ao manejo e à eficácia da
promessa
Cogita-se
da adequada interpretação jurídico-legal do gênero identificado como
"contratos preliminares", ou "pré-contratos", especialmente das
promessas unilaterais e bilaterais de compra e venda, quanto à sua
natureza jurídica, e os inevitáveis exames quanto à sua eficácia,
sobretudo no que respeita à sua autonomia ou dependência do contrato
definitivo, cuja extensão conduz impositivamente ao aspecto da
satisfatividade, considerando-se a necessidade de reprodução do
seu conteúdo ou à sua abstração, assim como das questões periféricas,
mas igualmente pertinentes, tais como respeitantes à forma e à exigência
material ou a sua exoneração, do registro do título constitutivo no
cartório de registro de imóveis competente, para legitimar-se à
postulação da ação de adjudicação compulsória.
Vamos
por partes.
Prima
facie, convém que se estimule a análise lógico-interpretativa do
ajuste contextualizado, a partir da percepção (ou intuição) dos
seus elementos mais ordinários e profanos.
O
fato gerador determinante da opção pelo ajuste é a conveniência,
e não a adequação do negocio jurídico. Só então o operador constata que
o negócio jurídico é válido e eficaz.
Mesmo
alheando-se a ficção segundo a qual ninguém ignora o disposto em lei, os
manejadores de instrumento contratuais, têm ciência que a compra e venda
de bens imóveis, por exemplo, só se valida através da escritura pública,
tanto, que o vocábulo "escritura" associa-se, para a totalidade das
pessoas, ao traslado emitido por oficial público competente e só ela
atribui a presunção absoluta e a prova material incontroversa do domínio
sobre o bem imóvel.
Não
obstante, a conveniência que inspirou a alternativa pelo modus
contratual, gera, necessária e indissociavelmente, a expectativa de
proteção, de tutela dos direitos coletados e atribuídos
co-respectivamente pelas partes. Não buscam as partes apenas a prova
material do ajuste, mas a possibilidade jurídica de exigir o
adimplemento da obrigação. Senão, teriam recorrido a um simples
documento de quitação, um recibo-declaração que tem, também, expressivo
uso corrente como comprovante do negócio realizado.
Pode-se
concluir, sem qualquer hesitação, que as partes buscaram, no que
denominaremos impropriamente, como recurso argumentativo corrente com o
modelo leigo, contrato informal, um instrumento alternativo para
a composição dos seus interesses e a fixação de suas obrigações,
acreditando-o como legitimo e eficaz, face ao impedimento circunstancial
de se louvarem na avença formal, conforme expusemos no inicio do
trabalho, sem tê-lo, obviamente, como o recurso de eficácia absoluta,
contudo, admitindo-o como meio válido para comprovar e ensejar a
execução das prestações.
Cremos
mesmo que é a gradação da eficácia do título aquisitivo de
direito, o elemento distintivo entre o contrato formal e o "informal",
do ponto de vista de percepção vulgar. O contrato de compra e venda de
imóveis, expresso através de escritura pública conferiria ao título –
embora assim não se considere do ponto de vista jurídico – valor
presuntivo de eficácia absoluta (jure et de jure) e a
promessa (3), valor relativamente eficaz (juris tantum).
Excede à percepção comum o predicado atinente à oponibilidade erga
omnes, porque a intuição de quem é detentor de um título
comprobatório de direito, reconhecido por lei, leva-o a conceber-se apto
a defender o objeto tutelado pelo título.
Tem-se,
então, que o contrato informal é reconhecido pela sociedade como título
hábil para a comprovação material do ajuste, apto, portanto, a
proporcionar às partes a execução co-respectiva das obrigações
estipuladas.
É
sabido que o contrato é iniciativa voluntária de economia privada, e que
a lei reconhece-o como ato jurídico, desde que estejam presentes os
pressupostos indispensáveis à configuração do negocio jurídico
objetivado pelas partes. E, dentre essas iniciativas, em acordo com a
doutrina do nosso direito positivo, perfiliam-se certos acordos imanente
à própria essência contratual, sendo, por isso, propriamente denominados
de contratos consensuais, porque se concluem apenas pelo consenso
das partes, não se lhes impondo qualquer requisito formal, senão a
essência volitiva. Dente esses contratos, distingue-se o da compra e
venda, para o qual, a contrario sensu, excepcionaliza-se uma
espécie formal e solene, quando a sua destinação objetiva
a transferencia de domínio dos bens imóveis, assim como a instituição de
direitos reais de um modo em geral, desde que exceda o valor venal
estabelecido em lei.
Os
contratos "informais" de compra e venda imobiliária, mesmo se lhes
concedendo natureza de direito real, tal como as promessas que contenham
cláusula de irretratabilidade, ou não explicitem o direito ao
arrependimento, não podem ser caracterizados como translativos de
direitos reais. Não vinculam o alienante à efetiva obrigação de
transferencia do domínio, mas a promessa do alienante em
obrigar-se futuramente a tal prestação, tanto que o adquirente ofereça
adimplemento às suas obrigações. É, portanto, contrato pessoal,
embora o implemento de solenidade facultativa – e não
compulsória, como ordinariamente se imagina – qual seja o registro do
instrumento da promessa no cartório de registro de imóveis competente,
adicione-lhe caráter real. Sendo o suplemento formal indispensável à
configuração do direito real uma faculdade do adquirente, que não dever
jurídico decorrente de norma coercitiva, não se pode imputar o realismo
como essencial à natureza do contrato de promessa de compra e venda de
bens imóveis.
Nada
obstante, o direito real conferido à avença, não substancia a
translatividade do domínio. A promessa irretratável submetida a
registro, possui um caráter real sui generis, não se mesclando
nem mesmo com os tradicionais direitos reais sobre a coisa alheia,
arrolados em numerus clausus pelo Código Civil. Resulta de
esforço interpretativo doutrinário e jurisprudencial, que se apoia na
inteligência de um único texto legal (DL 58/37), que trata da
matéria em um único artigo (22).
Releva-se,
então, um complexo e questionável direito real de aquisição, em
que a prestação pessoal do promitente vendedor, é substituída por
um insuspeitado jus in re aliena, consistente na obligatio
faciendi específica, que, não admitindo a alternativa satisfação da
garantia indenizatória, é suprida por sentença judicial que lhe atribui
natureza compulsória, cujo título é constitutivo do direito à
adjudicação da coisa prometida.
Mesmo
intencionando aceitar a proposição doutrinária tal como esta se
apresenta, ainda assim, não se configura direito autônomo, reconhecido
como absoluto, à transmissão do domínio, porque, por mais que se
pretenda afastar a prestação do promitente como indispensável à
execução da obrigação, é desta que se vale o adquirente ao pretender a
satisfação do seu crédito. Somente na injusta recusa de outorga do
contrato definitivo, ato provisionador do direito à efetiva
transferência do domínio, a coisa é exigida.
Pode-se
afirmar que a promessa, lastreada pela renúncia ao
arrependimento, institui, em favor do compromissário – desde que o
instrumento do contrato submeta-se ao registro competente – um
privilégio, qual seja a de que o adquirente, convertido em credor da
obrigação de fazer, possa valer-se da faculdade real, tanto que a
prestação pessoal do devedor não possa ser obtida.
Em
estreito arrazoado, crente de maior largueza expositiva e argumentativa,
a configuração do direito real, na hipótese em comento, aproxima-se mais
da estipulação de condição resolutiva imposta ao meio de aquisição, que
propriamente de categoria especial de direito real. A transmissão da
propriedade subordina-se ao implemento de condição que, uma vez
atendida, consagra o direito à própria coisa prometida, tanto quanto em
algumas espécies de contratos de vendas imobiliárias em geral em que se
estipula a resolubilidade da propriedade.
A
linha argumentativa, no nosso modesto modo de entender, é inexcedível.
Se, entretanto, esta for ultrapassada por exposição igual e contrária,
de amplo convencimento, que se adite em reforço à nossa exposição, a
evidente preexistência de norma jurídica constituinte do molde
contratual (DL 58/37) que reconhece a convenção como válida, além
de se lhe conceder a iniciativa da ação, que assegura o direito,
consubstanciado nos artigos 639 e 641 do Código de Processo Civil,
adiante transcritos.
Logo,
nada obsta à livre circulação do contrato "informal", nem se lhe
desnatura a configuração jurídica de ajuste de natureza pessoal, embora
com eficácia real quanto à execução da prestação prometida.
Coaduna-se,
por conclusão, a percepção vulgar com a expressão jurídica.
A autonomia, a eficácia e a satisfatividade da
promessa.
Sendo
a promessa modus válido e eficaz, e portanto, hábil, para
consagrar as obrigações, passemos à análise de dois dos componentes que
lhes são imputados – a provisoriedade e a autonomia ou dependência.
Ninguém,
nenhum intérprete do direito, poderá negar a irresistível convicção de
transitoriedade do contrato preliminar, seja por definição vocabular do
gênero que integra, ou pela destinação objetiva. Evidencia-se, então,
que a promessa fataliza-se à extinção desde que satisfeita a
obrigação que lhe deu causa.
Não
obstante, a promessa é uma prestação reclamada pelo adquirente, após
satisfeita a sua própria obrigação, quando, então, converte-se em credor
o alienante. Tem-se, por conseguinte, que o adimplemento d obrigação do
alienante é modo de extinção natural do contrato, por execução
bilateral das prestações, como de resto ocorre com todos os demais
contratos, não se particularizando esse efeito apenas em relação à
promessa.
O
que se pretende, de fato, saber, e este deve ser o ponto fulcral da
análise, é se o contrato dito preliminar é satisfativo ou
dependente do contrato definitivo, in casu, a promessa
irretratável de compra e venda, em relação ao contrato definitivo de
venda. E se a eficácia pode traduzir-se como satisfatividade,
reconhecendo-se no ajuste prévio, desde que válido como negócio
jurídico, a mesma produção de efeitos pertinente ao contrato típico.
As
nomenclaturas qualificativas do ajuste em comento, que o dão como
"preliminares", "preparatórios", "precursores" ou "pré-contratos", ao
par do tratamento de "definitivos" emprestado aos contratos para os
quais se concedeu nomen juris – essencial, dado sua tipicidade e
adequabilidade, ao negócio jurídico proposto pelas partes – prejudica,
por prevenção, o trato da controvérsia. Se conseguirmos superar o
preconceito vocabular, entretanto, é provável que as diferenças não
sejam assim tão evidentes. Senão, vejamos.
O
conteúdo do contrato assenta-se na manifestação volitiva das partes.
Pode-se dizer que o acordo de vontades é a essência do negócio jurídico,
o seu propósito e a sua causa eficiente. Tal manifestação pode ser
colhida em qualquer acordo válido, cujo instrumento seja reconhecido por
lei, tal como elucidam os artigos 131 (caput) (4) e 135 (5)
do Código Civil. Desnecessário, portanto, perquirir se o acordo de
vontades instrumentalizado por pré-contrato, impõe-se ao contrato
definitivo.
Na
hipótese do ajuste preparatório, ultrapassada a questão da sua própria
autonomia e validade como negócio jurídico, quer-se saber se as
estipulações devem ser compulsoriamente reproduzidas em contrato
definitivo como condição indispensável à execução do objeto material do
ajuste – a transferencia do domínio – ou se, abstraindo-se a
solutio da obrigação assumida pelo alienante – a outorga da
escritura pública – a convenção que teria caráter de mediação
para a conclusão do negócio jurídico, seria satisfativa, se
atenderia ao reclamo de eficácia, de atendimento ao objeto jurídico
perseguido pelo credor da promessa, já que se tem como ociosa a questão
da validade.
Conclui-se,
desde logo, que, se as condições pactuadas no contrato informal, o seu
conteúdo, atendendo a requerimento da melhor doutrina, guardarem
adequada conformidade com as exigências reclamadas pelo
contrato-tipo, (v.g. na compra e venda, as estipulações quanto
ao preço e ao objeto (6)) detalhando-os e os caracterizando como se
efetiva fosse a convenção, seria ocioso reproduzi-los, tanto quanto
ignorá-los seria reputar inócuo o contrato informal. Se, entretanto,
tais condições, indispensáveis à conformação do contrato de compra e
venda, forem ignoradas, tem-se que o ajuste informal seria mero
precursor, preparatório da avença final, reclamando a instrumentação
pública para a sua eficácia, porque a ausência das estipulações
substantivas, essenciais à própria determinabilidade do objeto jurídico
foram ignoradas, presumindo-se que as partes reservaram-se a faculdade
de instituí-las no ajuste formal.
Observa-se,
entretanto, que a hipótese não é de uso corrente na prática, em razão da
cautela que orienta as partes na formação de qualquer ato que requeira a
sua vinculação, mormente se buscaram o instrumento para consagrar as
correspectivas obrigações, conducentes ao objeto jurídico perseguido.
Este, por conseguinte, é sempre determinado, para que o ato se revista
de eficácia.
Veja-se,
então, que a reprodução do conteúdo predeterminado num contrato válido,
mesmo atinando-se ao indispensável suprimento de requisito formal
necessário à configuração do ato jurídico perfeito, seria exercício de
ociosidade que depõe contra a economia jurídica. Outrossim, se
desatendida fosse a prescrição legal de observância à forma expressa, e
o contrato precursor contivesse os elementos configurativos à sua
validade como negocio jurídico de caráter real – a forma escrita com
inclusa cláusula de irretratabilidade e o registro do título – o objeto
material estaria defeso, podendo o titular do direito exercê-lo erga
omnes, em caráter exclusivo e irrevogável, facultando-se, ainda, o
gozo dos direitos pertinentes à propriedade, de uso fruição, disposição
e de reivindicação, além de tê-lo potencialmente submetido à sua
jurisdição patrimonial.
O
efeito do contrato definitivo sobre o preliminar, seria, então,
meramente homologatório, ratificador, já que nem o contrato informal,
nem o formal, têm o condão de operar a transmissão do domínio visto que
ambos são títulos constitutivos de direito, que não títulos aquisitivos
de domínio, consoante definição da doutrina pátria, a meio caminho entre
as diretrizes do direito civil alemão e do franco-italiano (7).
Tenho
para mim que ambos se igualam como títulos constitutivos de direito real
sobre o imóvel, porque prometem a transmissão do domínio, visto que o
contrato definitivo, celebrado por escritura pública, como foi visto,
consiste em contrato informal de promessa irretratável. A diferença
essencial reside no efeito jurídico alcançado por intermedio de cada um
dos titulo, desde submetidos ao registro imobiliário. Na
promessa, o registro do titulo opera o direito real à aquisição do
domínio. Na escritura pública o registro opera o direito efetivo
ao próprio domínio.
Por
conclusão, tem-se que, se o escopo do adquirente for o de flanquear o
curso forçado da escritura pública, a que se submetem os contraentes por
força do disposto no artigo 134, II (8) do Código Civil, por
impedimento, temporário ou definitivo, ou conveniência de qualquer das
partes, requerendo-se, todavia, do titulo constitutivo assim chamado
"informal" a eficácia de direito real exigível pelo titular,
assegurando-o quanto à aquisição do domínio e à possibilidade de
defensividade erga omnes, o contrato preliminar atende à
conjuntura exposta, desde que não contenha, expressamente a faculdade do
arrependimento, e o titulo seja levado a registro no ofício imobiliário
competente. Podemos até mesmo afirmar que o titulo "informal" assim
constituído, pode ser reconhecido como atributivo de um direito
potencial absoluto à transmissão do domínio, a partir do
reconhecimento de que este ajuste, segundo Orlando Gomes (9), sinaliza
permanente "estado potencial" do contrato definitivo. Aliás, já o tinha
identificado anteriormente Filadelfo Azevedo (10) ("na
promessa se contém potencialmente a própria venda"). Logo, seu
conteúdo opera no sentido de assegurar a propriedade exclusiva ao
adquirente, impondo-se a abstenção universal de terceiros quanto à
gerência do patrimônio constituído pelo adquirente, por força do direito
à oposição contra todos, e da possibilidade jurídica de reivindicação
assistente ao promissário comprador. Com essa configuração essencial, a
transmissão do domínio, operada pela avença formal submissa à solenidade
do registro, apenas tornaria efetiva a propriedade, do ponto de vista
formal, sem estabelecer qualquer outra sorte de efeito que favorecesse
ao titular do domínio.
Há,
por conseguinte, definitividade e coercibilidade no
titulus constituendi, desde que o adquirente haja implemento as
prestações a que se obrigou, vez que, em tal situação, é inadmissível a
recusa do promitente vendedor em satisfazer a sua própria obrigação.
Louvados
nessa linha de raciocínio, podemos concluir que a escritura pública, em
relação ao contrato preliminar submetido aos rigores do decreto-lei
58/37, é ato meramente formal, confirmatório da avença precedente,
entretanto, único capaz de prestar-se à solenidade essencial do registro
para obtenção do domínio.
Do
ponto de vista utilitário, pragmático, em acordo com a ótica que
distingue a eficácia segundo os resultados projetados pelo interessado,
o contrato preliminar de compra e venda tem natureza satisfativa,
porque o titular do direito real à aquisição exerce sobre o bem
prometido, sem quaisquer restrições senão aquelas que vinculam também o
titular do domínio, os direitos elementares à propriedade, posto que
este o tem efetivamente como coisa própria, seja porque não pode
o titular da propriedade opor-se ou concorrer com ele quanto à
disposição do bem (11), exonerado que foi do poder dispositivo e do
próprio domínio pela condição resolutiva expressa na titularidade do
direito real conferido ao promissário adquirente, seja porque conta com
aptidão para exercer os atos defensivos da posse e da propriedade do
bem.
É
satisfativo o contrato preliminar, considerando-se a sua eficácia quanto
ao exercício do direitos pertinentes à propriedade. É também autônomo,
porque a soma de direitos coletados pelo promissário adquirente – à
exceção, naturalmente, da própria efetivação do domínio, reconhecido
como predicado meramente formal, já que a conferência da titularidade da
propriedade serviria ao exercício das mesmas faculdades autorizadas pela
promessa irretratável – induzem-no, ativa e passivamente à conduta
típica do proprietário, podendo alienar gratuita ou onerosamente,
transmitir por herança, fruir, gravar, gozar do privilégio da
irrevogabilidade do seu titulo (ou a perpetuidade do
domínio, se preferirem), conhecendo as mesmas exceções opostas ao
titular do domínio.
Concedem-lhe
ainda, a exclusividade sobre a prometida pertença, do ponto de
vista interno, quanto à utilização funcional, social ou econômica, da
coisa prometida e, externamente, como direito de constituir-se singular
na senhoria do bem, podendoreinvidica-lo (12 e 13) de terceiros que o
possuam injustamente.
E,
finalmente, da possibilidade de valer-se d atributo da
elasticidade conferido à sua disposição, consistente na faculdade
de ceder um ou alguns dos direitos fracionários à propriedade,
recuperando-os ao seu talante ou segundo as condições convencionais.
A desnecessidade da escritura pública e do
registro
para viabilizar a pretensão judicial da
adjudicação.
No
que concerne à possibilidade de adjudicação compulsória pela via
judicial, hoje é pacífico o entendimento de que basta a promessa com
cláusula de irretratabilidade, reduzida a escrito, mesmo por convenção
particular, para legitimar a postulação em juízo. É conveniente,
contudo, que se esclareça que há corrente de entendimento diverso,
respaldada em controversa interpretação.
Pretendem
os defensores da corrente oposta aos que advogam a informalidade do
titulo como elemento hábil à adjudicação, que uma ou as duas condições –
a escritura pública e/ou o registro do titulo – sejam pressupostos
elementares à configuração do direito à adjudicação. Sua justificativa
emerge da exig6encia da norma jurídica que dá como condição essencial à
validade do negócio de compra e venda de imóveis, a escritura pública,
tal como se depreende do artigo 134, II, referido. Defendem, por via de
conseqüência, que, em sendo o ajuste informal, ato precedente ao
contrato definitivo, e portanto submisso a este, conformar-se-ia como
espécie de dependente ou acessório, subserviente à forma determinada
para a sua conclusão.
Uma
vertente ou subsistema dessa corrente entende que é necessário que se
adite à imperatividade do instrumento público, o implemento da
solenidade que lhe seria substancialmente afeta, qual seja a do registro
do titulo no oficio público imobiliário competente. Ou mesmo, até
toleram que o ajuste se expresse por instrumento privado, desde que este
seja levado a registro.
Com
a devida vênia, é nossa convicção pessoal que a adjudicação é deferida
em reverência à natureza irretratável da convenção, quando o implemento
da obrigação (facere) prometida pelo devedor não conhece
alternativa válida à conclusão do negócio senão a própria transferencia
do domínio. É assim que se depreende dos "consideranda" (14) e da
própria inteligência do decreto lei 58/37, além da justificativa
política do edito afirmar-se em oposição ao favorecimento, involuntário
e circunstancial, de locupletamento, proporcionado do artigo 1.088 do
Código Civil, onde o legislador manifesta. Exatamente, a orientação
defendida pelos acólitos dessas razoes de convencimento. Portanto,
admitir-se que o procedimento ofertado como defensabilidade da convenção
preliminar, requisite a forma pública, seria validar o próprio
dispositivo legal atacado pelo DL 58/37, proscrevendo-se a tutela da boa
fé e firmeza da obrigação subscrita pelas partes, objeto de consideração
do provisionamento decretual. Assim é que, o artigo 16 do DL 58/37,
estatui, litteris:
Art. 16 – Recusando-se os compromitentes a outorgar a
escritura pública no caso do art. 15, o compromissário poderá propor,
para o cumprimento da obrigação, ação de adjudicação compulsória, que
tomará o rito sumaríssimo.
Explicita
o referido artigo 15, a hipótese de adimplemento da obrigação de
pagamento, por antecipação ou ultimação, ao encargo do promissário
comprador.
Precedentemente,
o artigo 11, que se refere supletivamente ao conteúdo da promessa, não
registra qualquer exigência quanto à forma do contrato, e até reconhece
a dupla alternativa na instrumentalização do contrato, como a
seguir:
Art. 11 – Do compromisso de compra e venda a que se
refere esta lei, contratado por instrumento público ou particular,
constarão sempre as seguintes especificações:
(o realce não consta do
original).
Pelo
exposto, não há qualquer imposição, ou sequer recomendação de forma
especifica, decorrente da lei especial. E não poderia ser diferente, já
esclarecemos que o contrato de compra e venda é dualístico quanto à
forma, por disposição expressa do direito codificado. A maioria da
doutrina concorda com sua natureza consensual, excepcionalizada quando o
objeto particulariza bens imóveis. No entanto, a prescrição formal
circunscreve-se aos contratos "... constitutivos ou translativos de
direitos reais sobre imóveis de valor superior a Cr$ 50.000 (
cinqüenta mil cruzeiros), excetuado o penhor agrícola" (
art.134, II CC).
In
casu, o direito real somente se configura, quando o titulo da
promessa é registrado no cartório competente e tal faculdade é extensiva
aos instrumentos particulares, logo, não há como impor a veracidade
jurídica da concepção formalista.
No
tocante à exig6encia do registro imobiliário para legitimação do direito
à ação de adjudicação compulsória, cremos ser suficiente a denúncia do
fato de que essa solenidade afeta mais à defensabilidade da titularidade
do direito ante terceiros, que qualquer outra justificativa. É assim a
expressão do art. 135 do Código Civil, quando dispõe que os efeitos
dos instrumentos particulares não se operam a respeito de terceiros,
senão antes de transcritos no registro público.
A
obligatio faciendi consistente na promessa de transferência de
domínio, é direito pessoal e configura-nos paradoxal exigir que
se registre em oficio imobiliário o título coletor dessa promessa para
torná-lo eficaz, apto a produzir os efeitos perseguidos pelas partes,
visto que se trata de prestação cometida ao promitente vendedor.
Parece-nos mais lógico que a exigência do registro se dê em razão da
constituição do direito real, que por si é oponível a terceiros.
O
móvel da vexata quaestio tem sido atribuída à redação do artigo
23 do DL 58/37, que ensejou, inclusive, a adoção da súmula 167 do
STF, por controvertida interpretação do texto em analise. Estabelece
o citado artigo:
Art. 23 – Nenhuma ação ou defesa se admitirá, fundada
nos dispositivos desta lei, sem apresentação de documento comprobatório
do registro por ela instituída.
O
Supremo Tribunal Federal, valendo-se de interpretação literal do
disposto na norma relacionada, e, em face da divergência
jurisprudencial, trouxe à lume o paradigma sumular já referido, nos
seguintes termos:
Não se aplica o regime do dec. Lei 58, de 19.12.37,
ao compromisso de compra e venda não inscrito no registro imobiliário,
salvo se o promitente vendedor se obrigou a efetuar o
registro.
Contudo,
por entender de justiça que o registro se desse supervenientemente à
formação do contrato, editou a súmula 168 possibilitando que o registro
pudesse ser feito no curso da ação. E essa foi a única concessão
admitida pela Colenda Corte da Justiça.
A
questão, ao nosso modesto ver, é de simples elucidação.
O
decreto-lei 58/37, tomou a se a regulamentação das promessas de compra e
venda de imóveis loteados e não-loteados, inserindo-os na
disciplina comum, para que se valessem, co-respectivamente, até onde
aproveitassem ou carecessem.
A
lei 6.766/79, conquanto não tenha derrogado inteiramente o DL 58/37 e
dedique-se à disciplina dos imóveis loteados, inovou o regime do decreto
referido, com a redação de dois dos seus artigos, o artigo 25 e o 46. O
primeiro, desvincula da adjudicação a obrigatoriedade do registro
("são irretratáveis os compromissos de compra e venda, cessões e
promessas de cessão, os que atribuam direito à adjudicação compulsória
e, estando registrados, confiram direito real oponível a terceiros")
sendo certo que tal solenidade só é imprescindível à aquisição de
direito real, visto que o condicionante ("estado
registrados") prende-se apenas à constituição desse direito. O
artigo 46, respondeu pela erradicação da divergência, derrogando o
artigo 23, já referido e transcrito, que condiciona o direito de ação
adjudicatória à comprovação do registro.
O
disposto na lei 6.766/79, encontra ainda resistências aparentemente
insuperáveis por parte dos defensores da integridade formal dos
compromissos de compra e venda, elegendo, como derradeiro argumento, o
fato de que a lei em comento, trata do parcelamento do solo urbano, vale
dizer, circunscrever-se-ia aos imóveis sujeitos ao regime de loteamento,
não incluindo os imóveis não-loteados.
Ora,
se foi possível à legislação inaugural sobre a matéria (dl 58/37)
tratar uniformemente, sem distinguir, os regimes imobiliários diversos,
desconsiderando a natureza dualista do objeto, como já acentuamos,
porque não poderia suscitar o mesmo resultado – senão por inferência
paradigmática, por analogia – a lei 6.766/79? Por que diferenciar o
tratamento oferecido às promessas de venda, entre imóveis loteados e
não-loteados, se o princípio informador da garantia e do privilégio não
encontra justificativa lógica, ética ou jurídica para a
desigualdade?
A
jurisprudência converge, uniformemente, para essa conclusão. Senão,
vejamos:
Adjudicação Compulsória. Promessa de Compra e
venda.
A ausência de registro da promessa de compra e venda
não constitui óbice para adjudicação compulsória de imóvel, ficando
superado o enunciado da Súmula 167 da Suprema
Corte...
(Ap.Cv. 190.354-2, CCv do TAMG – 22.02.95 – RJTAMG
58-59/209)
Adjudicação Compulsória. Titulo do vendedor não
registrado. Irrelevância. Carência de ação afastada.
Perfeito o ajuste em seu aspecto formal. A
adjudicação é o suprimento judicial de manifestação de vontade dos
vendedores. Execução direta, de cunho pessoal, entre os signatários da
obrigação originária, independentemente de qualquer formalidade. A
inexistência de registro do titulo dos vendedores é questão registrária,
não justificando o decreto de carência.
(agl 608.606-6, 2ª. C. do 1º.
TACv, RT 716/214)
Adjudicação Compulsória. Registro do Pré-Contrato.
Desnecessidade.
Para a ação de adjudicação compulsória é
desnecessário o registro do pré-contrato de compra e venda no Ofício
Imobiliário. A eficácia real, decorrente do registro, tem efeito erga
omnes, para prevenir direitos contra terceiros.
(ApCv 194147252, 3a . CCv do TARS.
31.08.94. JTARS 91/347)
Adjudicação Compulsória. Compromisso de Compra e
Venda.. Não-transcrição no Registro de Imóveis.
Enseja adjudicação compulsória o contrato de
compromisso de compra e venda não transcrito no Registro Imobiliário,
por ser de caráter pessoal o direito do promissário comprador,
constituindo a sentença adjudicatória suprimento da omissão do
promitente vendedor em outorgar o contrato.
(apCiv 120.196-9, 1a . CCv do TAMG.
18.03.92. RJTAMG 27/141)
Merece
destaque a ementa elaborada a partir de relatório do Ministro Sálvio de
Figueiredo Teixeira, do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), como a
seguir:
Compromisso de Compra e Venda – Instrumento
Particular. Validade. Registro, Prescindibilidade. Adjudicação
Compulsória deferida. CPC, arts. 639 e 641. Divergência doutrinária e
Jurisprudencial. Precedente da Corte. Recurso
desprovido.
A circunstância do compromisso de compra e venda Ter
sido celebrado através de instrumento particular não registrado não
inviabiliza por si só, a adjudicação compulsória, apresentando-se hábil
a sentença a produzir os efeitos a declaração de vontade
emitida.
(Resp 5.643-RS, 4a . T do STJ. 07.0591.
RSTJ 29/356).
Destarte,
como argumento final de definitivo, o regimento procedimental civil não
distingue as espécies segundo suas naturezas objetivas, nem requer o
suprimento instrumental formal ou registral, para que o postulante
valha-se do direito à execução da obrigação, obtendo sentença que lhe
confira a adjudicação do bem sub judice, suprindo-se a declaração
de vontade do faltoso, como se depreende da leitura dos artigos 639 e
641 do CPC, limitando-se o legislador ao vocábulo "contrato",
dessumindo-se a necessariedade, apenas, de comprovação do acordo de
vontades. Assim se expressam as normas referidas:
Art. 639 – Se aquele que se comprometeu a concluir um
contrato não cumprir a obrigação, a outra parte, sendo isso possível e
não excluído por titulo, poderá obter uma sentença que produza o mesmo
efeito do contrato a ser firmado.
Art. 641 – Condenado o devedor a emitir declaração de
vontade, a sentença, uma vez transitada em julgado, produzirá todos os
efeitos da declaração não emitida.
CONCLUSÕES
O
contrato de promessa (compromisso) (15) de compra e venda, desde
que não contenha expressa condição resolutória bilateral, consagrando
direito comum dos co-contraentes ao arrependimento, ou que contenha,
explicitamente, cláusula de irretratabilidade, é avença típica,
autônoma, inconfundível, substancialmente, com meto ajuste
precursor da compra e venda definitiva, posto que é
auto-suficiente no resguardo do direito real de propriedade, no tocante
à exclusividade na aquisição do domínio, desde que o título seja
reduzido a escrito e registrado no ofício público imobiliário
competente.
É
contrato satisfativo, do ponto de vista da eficácia segundo o
resultado objetivo e a tutela do direito à singularidade do domínio. O
titular do direito real à aquisição reclamaria a escritura pública
constitutiva do direito à transmissão do domínio, apenas para
confirmar-se senhorio da coisa adquirida, formalizando a sua
titularidade.
É
imperativo que se assinale que a moderna doutrina do direito civil
refere a substantividade da promessa, além da própria evidência da
satisfatividade coletada no direito material, que confirmam não apenas a
autonomia mas, até mesmo, a própria definitividade da
promessa.
Frederico
de Castro (16), concebe que a promessa, desde que não se exija o
cumprimento do contrato definitivo, ou a relação jurídica não seja
afetada por motivo que determine a sua extinção, "é vinculação
jurídica que vive com plena substantividade".
O
projeto do Código Civil (17), expressa, no artigo 457 a 459 (18), em
seção dedicada à disciplina do contrato preliminar, que o contrato
preliminar que contenha todos os requisitos essenciais ao contrato a ser
celebrado, uma vez concluído e dele consiste cláusula de
irretratabilidade, a pedido do interessado o juiz poderá suprir a
vontade do inadimplente, conferindo caráter definitivo ao contrato
preliminar.
Salvo
mais oportuno e valioso juízo, infere-se que o legislador entendeu
ociosa a execução compulsória voltada para a reprodução do contrato, tão
somente para consagrar uma formalidade, fixando-se em decreto
declaratório, constitutivo do direito à propriedade, concedendo ao
contrato preliminar a eficácia do ajuste definitivo.
À
luz do atual diploma civil, não se poderia concluir, evidentemente, pela
ociosidade da escritura pública de compra e venda e subsequente ato
registral, porque o artigo 530, I (19), do Código Civil, reclama o
registro do titulo de transferência (do domínio), como modo
de aquisição da propriedade pertinente à espécie. Tratamos, obviamente,
da equivalência dos títulos – ambos levados a registro no ofício
competente – quanto à produção de efeitos no que respeita ao exercício
dos direitos à própria coisa e à sua defensabilidade contra terceiros,
como já foi constatado.
Trata-se,
na efetivação da escritura pública de compra e venda, indubitavelmente,
de veraz constituição do direito à propriedade. Entretanto, pode-se
conceber que o suprimento dominial ofertado pelo contrato definitivo, em
oposição à preexistente promessa de transferência essencializada no
contrato informal, afigura-se como espécie de ato declaratório, já que
os poderes decorrentes da transmissão do domínio, assim constituído pelo
contrato definitivo, estão presentes no contrato de promessa, desde que
atendida à formalização indispensável à constituição do jus in
re.
Dispensando-se
os atos de fruição e de disposição, que também são pertinentes a outros
tipos contratuais que constituem o juz in re aliena – v.g. o
usufruto e a enfiteuse – o contrato de promessa atribui o direito à
reivindicação que é meio de defesa da coisa própria, visto que o
registro confere o direito de oponibilidade erga omnes, podendo
voltar-se o promissário comprador contra quem quer injustamente detenha
a coisa.
Não
fosse tão clara essa possibilidade jurídico-processual, a partir da
invocação da defensabilidade erga omnes, constatar-se-ia que essa
faculdade decorreria da própria aptidão para o exercício do direito à
adjudicação. Se o titular do direito à aquisição pode voltar-se contra o
titular da propriedade, poderá fazê-lo contra terceiros, desde que
superada a relatividade dos efeitos da convenção privada, com a
constituição do direito real oponível a terceiros, exsurgente do
registro do titulo constitutivo.
O
direito a adjudicação emerge do caráter irretratável da obrigação de
fazer dirigida à transmissão do domínio, objeto de execução compulsória
de que constitui titulo hábil a sentença judicial. O facere a que
se obrigou o alienante, é prestação típica que não pode ser adimplida de
outro modo senao pela outorga da escritura pública. Até mesmo porque,
não o fazendo, a sentença judicial supre a manifestação volitiva do
promitente, sem que o juiz, entretanto, substitua o contraente faltoso,
ou então o decreto seria desnaturado. Na verdade, o juízo determina a
execução específica do pré-contrato visto que o promitente, não obstante
a natureza irretratável do próprio gênero negocial (pacta sunt
servanda), reproduz especificamente a sua subordinação ao
caráter irrevogável e irretratável da obrigação especifica, renunciando
ao arrependimento – vale dizer, constituindo um vínculo definitivo à
promessa singularmente exigível, de tal sorte que só será satisfeito o
facere, afastando-se até mesmo a satisfação da prestação com a
alternativa obrigação de indenizar. Com a renúncia especifica, como que
derroga-se o principio nemo precise cogi potest ad factum, eis
que a cominação não se configura constrangimento físico ou privação da
liberdade. Por isso mesmo, torna-se dispensável a prestação pessoal, não
havendo como se justificar a titularidade do direito à aquisição, do ato
valido à constituição do domínio, senão em virtude da obligatio
faciendi especializada, posto que a formalidade suplementar
requerida para perfeição do ajuste, cinge-se à obtenção do direito à
oposição contra todos.
Por
todos os argumentos expendidos, à luz do ordenamento positivo e dos
julgados das cortes de justiça, consagra-se a satisfatividade do titulo
da promessa de compra e venda, desde que não contenha ressalva expressa
do direito ao arrependimento, e seja reduzida a termo escrito,
devidamente registrada no cartório de registro imobiliário competente,
tenha resgatado o promissário comprados as suas obrigações
convencionais, especialmente as de pagamento do preço avençado.
Finalmente,
não é excessivo aditar ao tema especifico, a recomendação do ilustre e
douto Miguel Reale, das mais autorizadas expressões da doutrina do
direito brasileiro, segundo a qual "...o Código Civil é a constituição
da sociedade civil, ...a constituição do homem comum." (20), e que, por
isso mesmo atende à demanda da sociedade. Ei porque o novo texto,
segundo a opinião do citado jurisconsulto, Supervisor da Comissão
Elaboradora e Revisora do Código Civil, tendencia-se mais para o
operacional que o conceptual, para o realismo que para o
abstrato.
O
próximo milênio marcará a definitiva superação do individualismo e do
formalismo, pela socialidade e pela operacionalidade. Não se abandonará,
com certeza, a forma, desde que necessária à substância do negócio ou à
cautela dos direitos que reclamam maior proteção da lei, mormente quando
se trate de preceitos de ordem pública. Mas a formalidade, sobretudo nos
negócios jurídicos, tende a minimização, na justa medida em que a norma
jurídica voltar-se-á, necessariamente, na busca de instrumentos de
garantia do adimplemento contratual.
NOTAS
1.
"Las Transformaciones Generales del Derecho". Editorial Heliasta.
1ª. Edição, Págs. 171.
2.
"Art. 1.088 – Quando o instrumento público for exigido como prova do
contrato, qualquer das partes pode arrepender-se, antes de o assinar,
ressarcindo à outra as perdas e danos resultantes do arrependimento, sem
prejuízo do estatuído nos arts. 1.095 a 1.097"
3.
É pitoresco e valioso constatar que a fórmula da estipulação romana
consagra duas expressões que vinculavam as obrigações das partes
co-respectivamente: - Spondesne? – Spondeo! (Prometes? Prometo!)
apud Léon Duguit "Las transformaciones generales del derecho"-
Editorial Heliasta/Argentina – sem registro de data ou edição, págs.
223
4.
Art. 131 – As declarações constantes de documentos assinados presumem-se
verdadeiras em relação aos signatários.
5.
Art. 135 – O instrumento particular, feito e assinado, ou somente
assinado por quem esteja na disposição e administração livre de seus
bens, sendo subscrito por duas testemunhas, provas as obrigações
convencionais de qualquer valor. Mas os seus efeitos, bem como os da
cessão, não se operam, a respeito de terceiros (Art. 1.067), antes
de transcrita no registro público.
6.
"Art. 1.126 – A compra venda, quando pura, considerar-se-á obrigatória e
perfeita, desde que as partes acordarem no objeto e no preço"
7.
Para o direito francês, "...promesse de vente vaut ventre" segundo
magistério de Planiol, Ripert e Boulanger "Traité élementaire de droit
civil" vol. 2.
8.
Art. 134 – É outrossim da substância do ato a escritura pública
I
–
II
– Nos contratos constitutivos ou translativo de direitos reais sobre
imóveis de valor superior a Cr$ 50.000,00 (cinqüenta mil
cruzeiros), excetuando o penhor agrícola.
9.
Contratos, Ed. Forense, 1997. Pág. 139.
10.
Apud PEREIRA, Caio Mário S., Inst, Dir. Civil, Forense, 1984.
Pág. 59.
11.
"O registro do compromisso de compra e venda no Registro Imobiliário
gera direito real oponível a terceiros. Ser oponível a terceiros
significa que, uma vez registrado o compromisso, perde o
proprietário o poder de disposição da coisa prometida" RT, 490:187 –
apud DINIZ, Maria Helena "Tratado Teórico e Prático dos
Contratos", vol. 1, págs. 295 (As expressões "registro" e
"registrado", realçados pelo autor, servem à disciplina da Lei 6.015/73
e não constam do original, que se refere a "inscrição" e
"inscrito").
12.
"O compromisso de compra e venda irrevogável e irretratável cujo preço
está totalmente pago e que se encontra devidamente registrado confere a
seu titular direito real oponível erga omnes e, portanto, o poder
de reivindicar o imóvel" RT, 593:74 – apud DINIZ, Maria Helena
"Tratado Teórico e Prático dos Contratos", vol. 1, págs. 294.
13.
"Ação Reinvidicatória – Promissário Comprador – Equiparação do
dominus. Se ao ajuizar uma ação reivindicatória seus autores são
titulares de compromisso de compra e venda irretratável e inscrito,
gerador de direito real, este compromisso equipara-os ao dominus,
inclusive para efeito de reivindicar" TJSP, ac. Un. Da 2a
CCv, in ADCOAS 1981.
14.
"Considerando o crescente desenvolvimento da loteação de terrenos para
venda mediante o pagamento do preço em prestações; Considerando que as
transações assim realizadas não transferem o domínio ao comprador, uma
vez que o art. 1.088 do Código Civil permite a qualquer das partes
arrepender-se, antes de assinada a escritura de compra e venda;
Considerando que esse dispositivo deixa praticamente sem amparo
numerosos compradores de lotes, que têm assim por exclusiva garantia a
seriedade, a boa-fé e a solvabilidade das empresas vendedoras;
Considerando que para segurança das transações realizadas mediante
compromisso de compra e venda de lotes, cumpre acautelar o
compromissário contra futuras alienações ou onerações dos lotes
comprometidos:..."
(O realce não consta do original)
15.
Preferimos a denominação "promessa", para extremá-la do "compromisso" a
que se refere a seção I, Capítulo XIV do Livro III do Código de Processo
Civil, expresso conceitualmente no art. 1.072 e seguintes do mesmo
diploma legal.
16.
"La Promessa de Contrato". Apud GOMES, Orlando. Op. Cit. Pág.
139
17.
"Anteprojeto de Código Civil", Saraiva, 1972
18.
"Art. 457 – O contrato preliminar, exceto quanto à forma, deve conter
todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado"
"Art.
458 – Concluído o contrato preliminar, com observância do disposto no
artigo anterior, e desde que do mesmo conste cláusula de
irretratabilidade, qualquer das partes terá o direito de exigir a
celebração do definitivo, assinando prazo à outra parte que o
efetive."
"Art.
459 – Esgotado esse prazo, poderá o juiz, a pedido do interessado,
suprir a vontade da parte inadimplente, conferindo caráter definitivo
ao contrato preliminar, salvo se a isto não se opuser a natureza da
obrigação" (o realce não consta do original.)
19.
"Art. 530 – Adquire-se a propriedade imóvel:
I
– Pela transcrição do título de transferência no registro de
imóvel."
20.
"Visão geral do Projeto do Código Civil", in Revista Literária do
Direito., Maio/Junho de 1998, págs. 10.